Melancolias e Alguns Versos IV

Minha tristeza me toma

Do meu pensamento se adona

Engolindo a doçura que resta em mim

Dor e silêncio é tudo o que sobra no fim

O veneno a pingar no olhar,

A ira que corre no sangue,

Tortura minha mente, persegue

Contemplando minha alma a definhar

A piedade dos homens bem que engana,

Sob a falsa máscara da amizade

Nos olhos, a cobiça, na mente, a gana

Pois aqui, não há beleza sem crueldade

Lobos famintos farejam a fraqueza,

Corvos estáticos contemplam a frieza

Aqui não há tempo para compaixão

Para o fracasso, não há paciência ou perdão

Mate minha fome, estou a suplicar

Mate minha sede, estou a ofegar

A insônia abre as portas para a loucura,

Deixando, à mercê do diabo, a criatura

Toda a noite peço perdão,

Encurralada pela vergonha, no fim

Quisera eu ser salva pela minha devoção

Mas meu pecado está sempre diante de mim

Pelo meu ventre, a morte a falar

Pelo meu esôfago, dor a expurgar

Na cama se contorce minha carne lastimada

Aos céus, implora minha alma condenada

Os anjos velam meu perecer

Silenciosos, pois não há o que fazer

Por mais que seja inútil resistir

Brota de dentro aquele medo de partir

Meu ventre está sangrando, meu amor

Suas flechas cravaram fundo em mim

Misturado à minha seiva, escorre o rancor

Que banha todo esse abismo sem fim

Você tirou a vida do meu corpo,

Levou embora a luz dos meus olhos

Corroeu meu espírito, sem remorsos

Sua paixão foi meu maior agouro

Não de mim, virá sua condenação

Mas não morra esperando o meu perdão

Lanço minha ira sovre esse mundo mortal

Tragá-lo-á feito uma peste letal

Os anos que roubaste da minha vida,

Em cada lágrima a escorrer do seu rosto,

Cobrarei essa preciosa dívida

Que há de me pagar por cada desgosto

Já implorei a meus olhos

Pararem de sangrar por ti

Já reuni os retalhos

Dessa alma despedaçada por ti

Não tenho mais orgulho,

Nem sou capaz de me envergonhar

Se a seus pés me jogo e me debulho

Pois sem você, não sou capaz de sonhar

Diga-me, como consigo deixar de te amar

E desta triste sina me libertar,

Sem que eu pare de respirar

E nesse corpo não haja mais alma?