Carreta
Carreta velha de angico,
Esteio do meu Rio Grande.
Por onde quer que tu ande
Deixa teu rastro no chão.
Cambaleante pela estrada
Rangindo teu canto triste
Ainda bem que tu existe
P’ra garantir o meu pão.
Foi num passado distante
Feita pelo velho Chico
Que esculpiu no angico
Cabeçalho e recavém.
É por isso que tu tens
Em teu cerne encravado
A história de um Estado
Que é minha história também.
Carreta inteira ou três quartos
Não importa a dimensão
Pois cruzou este rincão
Originando cidades.
Na Campanha, nas Missões
Na Colônia ou na Fronteira
Nesta Terra altaneira
A carreta deixa saudades.
Foi capital da Província
Na epopéia farrapa
Rodando valente e guapa
Mesclando sangue e pó.
E de combate em combate
No decênio fratricida
Foi gabinete e guarida
De Arroio Grande à Quaró.
Nos versos de tantos poetas
Foste imortalizada
E muitas vezes cantada
Em poesia e canção.
Uma singela homenagem
Que vem do fundo do peito
E demonstra o respeito
Da gente deste torrão.
A carreta é uma legenda
De um tempo que já se foi,
No tranco lerdo dos bois
Tocados pela “guiada”.
Na guerra, foste morada
Na paz, serviu de sustento
E hoje és monumento
Vivo, rodando na estrada.
Toldada de Santa-fé
Como um rancho ambulante
Rústica e aconchegante
Perto de um fogo de chão.
Parece até o meu galpão
De quincha esverdeada
Numa noite enluarada
Quando sorvo um chimarrão.
Oh! Carreta se soubesses
O que eu sinto em meu peito
Até fico meio sem jeito
Pois é feio homem chorar.
Mas o que posso fazer?
Quando se achega a saudade
E me invade uma vontade
Do ofício de carretear.
P’ra os lados de Vista Alegre
Aos moços que não conheça,
Ainda existe carreta
Dando exemplo aos demais.
Levando e trazendo carga
Neste lendário ritual
Tu és o cartão postal
Da Terra dos Marechais.
( "Terra dos Marechais", cidade de São Gabriel-RS; "Vista Alegre" localidade no interior do município de São Gabriel).