Legado de andejo

A xucra lida retrata

De forma lenta e constante

No passo de quem garante

E ao mesmo tempo delata

Que a vida mesmo nos mata

Pois ela, china que enleva

Feiticeira, índia maleva

Como toque de bordona

Enfeitiça e tensiona

Até que um dia nos leva.

Em cada mate sorvido

Se vai algum pensamento

Levando nesse momento

Recuerdos velhos vividos

Deixando um índio ferido

Essa é a sina selvagem

Que marca nossa passagem

Por este mundo imponente

Onde ninguém é semente

Todo mundo segue a viagem.

Aqui está meu pensamento

Redigido com verdade

Na mais pura realidade

Todo ele eu sustento

Vou passando igual ao vento

E deixando minha marca

Em alguma que outra tarca

Deste xucro hemisfério

Inundado de mistérios

Pra quem de vida se encharca.

Não conheço as razões

De viver não sei pra quê

Só entendo a grande fé

Companheira de ilusões

Sabe agüentar solidões

Quando bate a saudade

Pois não existe hombridade

Pra suportar o seu “S”

Se o peito dela padece

Necessita divindade.

Essa é a luz que nos guia

Nos momentos de tormenta

Só a fé nos alimenta

Numa eterna fidalguia

Pois a vida é uma poesia

Com doce gosto de mel

Que o homem transforma em fel

Na sua sina mais dolente

Sendo gratuitamente

Dos bichos, o ser mais cruel.

A emoção vai quando canto

Também gosto de escutar

Àquele que sabe cantar

As dores do próprio pranto

Senhores, eu lhes garanto

É uma escola de vida

Ouvir quem canta feridas

Sangradas na solidão

Mostrando seu coração

Derramando despedidas.

Parece um sofrimento

O exercício de viver

Pois se aprende no sofrer

Esse é o fundamento

Começa no nascimento

Se estende depois na lida

E o índio não tem guarida

Depois de chegar no mundo

Se levanta e cai no fundo

Com a alma distorcida.

Assim o tempo coroa

O dia que sempre passa

Não importa quanto se faça

Pra segurar sua proa

Ele ensina e magoa

Nos leva “muy” lentamente

Para outro continente

Onde reina o Senhor

Pois aqui há tanta dor

Que penetra até na mente.

E da dor posso falar

Dela sempre fui aluno

Nesta sina de reiúno

Não há nada pra sonhar

Pouco tenho para dar

A não ser algum conselho

Pois a mala de um velho

Carregada está de tudo

Cada dia é um estudo

E a vida dá de relho.

Qualquer cousa que se faça

Tem retorno e vem a nós

De forma lenta ou veloz

Nos alcança e enlaça

Golpeia forte ou abraça

Isso depende da gente

Plantamos muitas sementes

E a colheita é garantida

Melhor não plantar feridas

Para viver docemente.

Assim ensina o segredo

Que há tempo foi explicado:

Viver não é complicado

Ninguém deve ter medo

Se é doce ou azedo

O caminho onde trilhamos

Depende do que plantamos

Nunca vem nada de graça

Se há fogo, há fumaça

O destino, nós talhamos.

Por isso quero lembrar

A esses velhos daninhos

Surrupiadores de ninhos

Doutores no seu falar

Que um dia vamos cansar

De tanta promessa dita

Nesta Pátria que hoje grita

De pobreza e de miséria

E faremos coisa séria

Pra um dia vê-la bendita.

Não há nada melhor à paz

Pra se viver no sossego

Sentado nalgum pelego

Olhando a tarde que traz

Um poncho vermelho atrás

Cobrindo o céu do horizonte

Deixando mais belo o monte

Numa espécie de magia

Gerada na liturgia

Que o dia traz em reponte.

Porém, se for necessário

Devemos mostrar os “dente”

Desvendando pra essa gente

O nosso ser libertário

Que habita neste santuário

De forma sempre latente

Situado no continente

Onde reina este bruxo

Apelidado Gaúcho

Por ser bravo e valente.

Tô chegando já no fim

Desta crua redação

Não falei por pretensão

Simplesmente sou assim:

Do que a vida deu pra mim

Também quis compartilhar

Se entendeu, pode espalhar

Esse é o meu desejo

Vou seguir tal qual andejo

Tenho muito pra trilhar.