A 'DANÇARINA' DO CASTELO
Com uma pele flácida e músculos enrijecidos,
ela não consegue mais abraçar;
dilatada, alargada, passeia no vão aberto,
desbastado por mãos estranhas.
Maças descoloridas, esmaecidas e mordiscadas,
mãos que trazem impressões digitais obliteradas,
sequelas ósseas de uma dança infernal,
são os bailes das entidades mortas.
Hoje não dança mais, não pula, não canta,
não sorri, matou as estrelas que estavam
por nascer, deu vida ao artificial, engoliu látex,
vomitou leite, dormiu o dia inteiro.
Traz o nojo, o tédio, o desgosto, deu o corpo
como banquete aos corvos, era um féretro vivo;
uma sombra a bailar, sem registro e sem identidade,
esquecida de qualquer referência, esquecida do Sol.
Descrente, arredia, insolente, índia do mato,
amante do negro Baiano, robusto e forte devorador;
não há mais como jogar peteca, os jogadores fugiram;
em outro terreiro, em outra tenda, a gira deve continuar.
Não há mais canteiro que abrigue a sua semente;
nos invernos passados, era grande a erosão;
hoje existe cavernas escuras, pesadelos sem fim;
tudo míngua, o coração esfria, a gira encerrou.
Pedro Matos