MATEM-ME, POR FAVOR...

Se um dia eu parar de escrever

E não olhar mais o céu

E não chorar mais por amor

Se um dia eu deixar a canção rolar

Sem balbuciar a letra

Sem querer cantar junto

Se um dia eu não sentir mais saudades

E não souber pedir pra voltar

E não souber pedir desculpas

Se um dia eu me dobrar ao capitalismo selvagem

E não sonhar mais com a vida numa praia deserta

Se eu não mais sonhar...

Se eu não sentir mais o cheiro das rosas

E cultiva-las,

Mesmo sabendo que logo-logo suas pétalas cairão

Se eu não mais parar para olhar o rio

E meditar em silêncio

Ou andar falando sozinho na rua

Se um dia eu deixar de tocar o violão

As três e tantas da madrugada

E deixar de escrever quando todos dormem...

Se um dia, porventura,

Eu não mais desejar anaileh

E não mais me encantar com os olhos castanhos

Se eu não mais sentir

E deixar de amar Vinícius de Moraes

E não gostar mais de blues

E enjoar beatles

E enjoar chocolate

E não usar mais all star

E se um dia, por força

Ou simples distração,

Me acostumar com todo esse mundano pavor

Pelos deuses da terra

E pelos anjos do céu:

Matem-me, por favor.