Não és mais poeta

Ainda tens inspiração?

Agora que cruzaste a linha

Que só te importa o corpo

e a satisfação

Tens inspiração?

Se procuraste tu mesmo alimentar

o prazer

e repudiar a emoção

Não tens inspiração.

Pois que a criança pura cresceste

E ela nem mais chora

Ri da piedosa ilusão

Não tens mais ilusão.

Não sonhas, nem amas

Se és, te fazes somente

da ação.

Como queres ainda ser poeta

Se malograste o sofrimento

Se sucumbiste ao desalento

sem saboreá-lo ao menos uma letra.

Como queres ser poeta

Se te entregaste à fraqueza

E renunciaste à tristeza

Ao transformar teu coração.

Esse novo nem é certo um coração

Mais parece um órgão que bate

e jorra sangue

Canta mais nenhuma canção

Não reclamas

Foste tu quem o quiseste assim

Põe fora a pena

Vai por aí a vegetar sem mim.