Meu Coração, Suplica, prostituta, meu encanto Mar, Fortaleza

MEU CORAÇÃO

apertos expansões

Dilatações mil contrações

Conheço meu coração

Formato espaço

Sístoles diástoles

Veias artérias

Sem falsidade

Transportando sangue

Máquina-gente

Neste templo

Que contemplo

O sangue escuro

Às vezes se faz duro

E descontente

com muita gente

Tenho saudade

De um outro coração

Que amei

Ânsia amorosa

No recordar das paixões

Coração que se fez alheio

Calado deserto

Negando-me o maná

Da esperança

Minh’alma desprovida

Dessa gota cristalina

Ausentava-se da calma

Sofrendo com o dia

Na dolorosa impressão

De haver amado em vão

Fui visto assim

Esquecido e longe do bem-querer

Mas embora não fosse

Aquecido por aquele amor

Tão sentido

Ele muito me ajudou

A viver

Magoado e desprezado

O ciúme me aguilhoou

Desiludido vivi

Foi como se o velho mar

Negasse o pingo d’água

À fonte do amor

O coração sem jeito disse

— Cala-te sujeito!

Ninguém no mundo é perfeito

Por que será?

Embora sem ter vivido

Todo amor que senti

Jamais dele me esqueci

Marchei sem rumo

Mulheres buscando incerto

Sem meta prumo reta

Caminhei ouvindo

Parando pensando

Ficando suspenso

Expectante de um triste fado

Não raro invejado

Desejado amado

Senti-me condenado

Sem saber por quem

Ou por que

Morto-vivo me senti

Vivendo de mortos objetivos

Fui sem futuro

Barrado no escuro

Sem ar puro pra respirar

Vitória ou glória

Sem saber por que desejar

Por entre as batidas

Do meu coração

Ressoa ainda o trovão

Da luta que se refaz

Sempre para não morrer

O fanal de salutares emoções

...

Prostituta

Na vida estive no mar

Da indiferença

Habitado por feras

Crudelíssimas

Escorpiões

Víboras fabricando dores mortais

Nas oficinas da vida

Sonhos desfeitos fizeram

Esmaecer no peito

A doce ilusão de muito querer

Estafa de amor

Fingimento maldito

Massacrando o sentimento

Chorei lhe adorando

Me sentindo culpado

Indiferente

Quem é

Cadê

O que é de você?

Me fez chorar sofrer

Um dia joguei a vida

No mar da morte me perdi

Para amar você

...

Súplica

Humilde é a voz que clama

Pela presença-chama

Da companhia-mulher

Sentido e apoio à vida

Meu amor não me deixe só

Pois assim não quer Deus

Que fique o homem

Não deixe a solidão

Obscurecer minha vida

Deixe sim

Comigo

A sua luz vidente de amor

O seu bem-querer

Em mim pode anular

A intransigência

A descrença

O desânimo atroz

Envolva-me no aroma

Do seu perfume

Venha marcar-me

Com seu amor

Venha sim

Para aquecer

Meu coração

Venha em chamas

Chamas vivas de amor

Chamas que marcam

Profundamente

Vidas

Tremor sutil

Letras de fogo

Gravadas no coração

Fortaleza

Rua Washington Luís

A Praia do Futuro

Este céu nem sempre é o mesmo

Redescubro-me criança

Ludhiana

Ludmila

Areia já não é tão branca

Música de Toquinho e Vinícius

Mar verde-azul

Sonhos de Neruda

No muro

O despertar

De Mastruz-com-leite

O forno pimenta malagueta

Esquenta nossa participação

O quadro do melhor pintor

Está entre a Volta de Jurema

E a Praia de Iracema

Bate e rebate

O mar no meu coração

Praia do Náutico

Não há espaço pra tristeza

Fortaleza é o fim

Da Solidão

Neste amanhecer

De praias límpidas

O céu está ao nosso alcance

A maré vem molhar meus sonhos

Quando volta se desfaz

Minha fantasia

...

Meu Encanto-Mar

Em fortaleza

De tantas luzes

Muita luz vem do mar

Graça e beleza

No rosto de cada criatura

No olhar um brilho

Singular

Pouco importa

As posses que se tem

A fala com jeito próprio

Linguagem objetiva

Límpida

A orla marítima

O Futuro – Que praia linda!

O Mucuripe – domínio dos pescadores

Mágica Volta de Jurema

Chegar à praia de Iracema

É reviver a doce origem

Do povo do Ceará

Guimarães Rocha
Enviado por Guimarães Rocha em 08/04/2006
Código do texto: T135989