O HOMEM MAIS FEIO E INFELIZ DO MUNDO (AUTOBIOGRAFIA "CONVERSAS DOM MACAÚBAS)

Capítulo XVII

Você conhece Neco? Né comigo não! Diz o locutor esportivo Sílvio Mendes da Rádio Sociedade da Bahia. Neco, a quem passo a me referir era assim: um homem velho, pobre, analfabeto, sozinho e muito feio, portanto, achava-se muitíssimo infeliz.

Suas histórias merecem o registro nessas nossas “Conversas com Macaúbas”.

Ele trabalhava na Prefeitura de Serrinha, mais precisamente muito próximo de mim, assim uma espécie de estafeta, de moleque de recado. Eu escriturava o chamado Livro de Aforamento, onde constavam contratos de cessão e posse de terrenos doados pela prefeitura para pessoas de baixa renda e durante a primeira gestão do prefeito Aluízio Carneiro da Silva, iniciada em 1971 e permitiu o aparecimento de dois, hoje populosos e importantes bairros na cidade, Vaquejada e Cidade Nova. Esse livro circulava pelas minhas mãos e as de um outro senhor, funcionário antigo e efetivo, que atendia pelo nome de Zeles Cordeiro.

Certa feita, eu pedi a Neco para que trouxesse até a mim, o tal Livro de Aforamento. Eu não sei até hoje o que foi que ele entendeu do meu pedido, mas saiu porta a fora do Paço Municipal e se dirigiu à Delegacia de Polícia. Bem, isso eu fiquei sabendo no seu demorado retorno, motivando uma reclamação, pois pensei que ele tivesse simplesmente saído para outro afazer seu particular.

E foi aquele Deus nos acuda, a explicação pela delonga. Que o delegado mandou dizer que o livro se encontrava na delegacia, que não poderia sair de lá porque não era bem um livro daquele assunto específico e sim de registro de queixas criminais.

Depois de algum tempo, enfim, o Sr. Zeles Cordeiro aparece com o livro solicitado e me entrega, o que fez piorar ainda a minha compreensão acerca das explicações de Neco.

Somente alguns dias depois quando me encontrei casualmente com o delegado, foi que enfim elucidamos a questão. É que, nosso personagem alvo neste capítulo buscara junto à Delegacia, o Livro de Defloramento. Bem, Aforamento e Defloramento

Noutro dia encontro Neco Mira chorando. Se ele era feio sorrindo, imaginem chorando! Preocupei-me com o fato e pedi explicações e depois de muita insistência, ouvi dele as explicações:

- Sou um homem velho, muito velho. Pobre, muito pobre. Analfabeto de pai e mãe. Sozinho, muito sozinho e donzelo, nunca tive uma mulher. Feio. Muito feio! Eu me acho o homem mais feio do mundo. Por tudo isso e principalmente pela feiúra, eu sou muito infeliz.

Tentei consolá-lo de todo jeito, em vão. Aí, ocorreu-me uma idéia. Levá-lo ao visinho município de Conceição do Coité para mostrá-lo um cidadão rico, muito rico. Letrado, muito letrado, comerciante bem sucedido, mas feio, muitíssimo feio, pra lá de horroroso. Bem, só não sabia de sua felicidade ou infelicidade, de sua vida íntima e particular, mas pude mudar o astral de Neco Mira que mirava o seu rival em feiúra e ria, ria incontrolavelmente.

Para que todo mundo perceba o quanto a questão do aspecto físico é importante para as pessoas. Muitas vezes, mais que dinheiro, escolaridade e outras “cositas” mais.

Antonio Fernando Peltier
Enviado por Antonio Fernando Peltier em 28/01/2009
Reeditado em 06/05/2009
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