[Noturno para Luciana]

[Tributo à deusa grega dos tormentos da noite]

Se eu pudesse entender o teu mistério, mulher,

eu te admitiria como és, e talvez me resignasse!

Mas, como a bela deusa grega do inferno do prazer,

surges na noite para me enlouquecer de desejo!

Sentada nos degraus dessa escadaria pública,

és pura luxúria, és um desafio às minhas carnes...

Passo devagar... o meu olhar acaricia os teus cabelos,

beija o teu rosto, os teus lábios, os teus seios...

Espero os teus verdes olhos procurarem os meus,

e recebo um leve sorriso e um aceno de mão;

na vibração gelada que me percorre o corpo,

esqueço que estou ao volante do meu carro...

Imagino o teu corpo pulsando sobre o meu,

sinto o cheiro suave de teus cabelos loiros,

acaricio a macieza de tuas coxas sensuais,

e experimento a fruição de um gozo inefável!

Tu me olhas e me chamas... a ver se me decido;

sou só ansiedade, minhas mãos suam frio ao volante!

Mas não! Que não a quero assim — quero-a toda,

só para mim, no sem-fim de milhares de instantes!

O trânsito aperta; luzes piscam atrás de mim;

acelero o meu carro, e sigo em frente... só!

E tu, a bela deusa grega que me enlouquece,

não voltarás ainda para a lua — outro te quer...

Ao longe, os cães ladram para o ermo de mim,

e a noite fria estende-se sobre o meu silêncio...

Eu queria não estar só em meu mundo,

e não ter a lucidez como cruel inimiga!

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[Penas do Desterro, 31 de agosto de 2005]