Vagando as horas

Vagando as horas

As horas vagas

São vagões no trem do tempo.

Os minutos,

Minuetos, conta-gotas diminutos.

Só a caneta

Tira da garganta palavras não ditas.

Nos pavilhões dos ouvidos,

Ouvem-se suspiros intranqüilos,

Desvairadas versões em que acredito.

Num lapso do tempo,

O colapso de uma civilização falida.

No beijo não-dado,

Nem na despedida,

Nem na volta que não há sem ter a ida,

Gira a vida

Como um carrossel sem ter criança,

Já sem infância, nem lembrança

De que tenha um dia acontecido.

As horas vagas

Escorregam na garganta.

Sufocados gritos, são gemidos

Espremidos no peito oco

Repleto de esperanças e sandices.

Sob o colo, um craquelê de cacos colados,

Cansado dos petardos vindos de todos os lados

Dos infartos, dos maltratos, dos contratos não cumpridos

De jura, de procura, de loucura.

Já sem cura, nem nos comprimidos.

Ô dias compridos, cosidos nas horas,

Cumpridos à noite, coçando as doridas

Marcas das horas: feridas de açoite.

(Djalma Silveira)