A rua mandou

Um dia a rua me disse:

Vai, desce e cresce na vagabundagem!

Eu desci a ladeira devagar

Repensando toda a viagem

Vi poetas, menestréis e vultos

Vi a escadaria da igreja imunda

Mas fingi que era limpo

Fingi que era tudo lindo

E eu descendo e indo mais além

Vi cacos de vidro no asfalto

E uns mendigos chorando alto

E desci inda mais

Catei d’um buteco um ‘cado de pinga

Desceu rasgando, deu até calafrio!

Mas o calafrio, meu rapaz

Não era da pinga não

Era por causa d’um morto no caixão

Fingi que era bonito e desci

A rua me mandara crescer, descer...

Vi até seu Zé com o chapéu na mão

Mas não parei não!

Desci e fui até onde o vento soprava

Mas que maldade, não ‘guentei e caí

O gosto da pinga me enjoou...

Quando passa uma carola e fala:

“Mas que vagabundo! Que horror!”