[À Solta na Tarde]

[Pensamenteando à mesa do bar...]

A calmaria das ruas no entardecer

enlanguesce o meu espírito.

Enquanto dirijo meu carro calmamente,

noto que os transeuntes não têm pressa,

parecem sintonizados com o crepúsculo...

mas eu, se não me sentisse tão infeliz,

talvez tivesse pressa de chegar...

Essa vontade de chorar,

esse nó na garganta —

será a vida revirada;

a casa sem ela;

o trabalho sem nexo?

Estaciono o carro para ver melhor o mundo —

a mesa do bar é um excelente observatório!

eu penso: será apenas loucura, ciclotimia,

descompreensão da necessidade da dor,

esquecimento de como acompanhar féretros?

Mais um dia... sim, mais um dia

a esperar o trabalho dos vermes

dar cabo do que resta de mim!

Toco-me; sinto o pulso — estou vivo;

mas neste instante, abro outra janela e vejo:

o féretro de mim passa em frente ao bar...

Será que há tanta gente assim, como eu,

invingado dos tombos da vida,

carregando o fardo das velhas perdas,

à solta por aí?! Eu trescalo doença...

estar comigo é um perigo...

[Penas do Desterro, 21 de novembro de 2005]

Caderninho das Cidades Mortas, p. 30

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 17/11/2009
Reeditado em 22/04/2012
Código do texto: T1927889
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