Faroeste
que a solidão seja minha guia
que a solidão me siga para sempre
que a solidão me assole
que a solidão me lacre
que a solidão me assalte
que a solidão me dilacere
e seja
- seca -
minha companheira.
eu sou um daqueles que idolatram solidão
eu necessito de solidão pra viver é meu câncer se arrancarem de mim morro junto se não arrancarem morro também, enfim, por inércia, não arranquem minha porção de vazia solidão do estômago
e das tripas, o corpo dentro da solidão,
seguindo assim
por estradas poeirentas e tortuosas
como um filme de faroeste
sem nunca chegar de fato a lugar algum,
sempre distante,
ásperos e sujos eu e meu cavalo solidão, cavalgamos, morrendo de sede não de água mas de coisas que não conhecemos, por aí, observando também altas luas e índios que dançam nus e gelados como estrelas, fazendo sons inaudíveis e que, realmente, já perderam sentido, como os filmes de faroeste.
eu e minha solidão
meu irmão
meu sangue
minha luta
e, sim, qualquer outra coisa,
porque a poesia é também aceitar a si próprio, sem segredos nem mistérios nem grifos nem quimeras de areia fina e vento
(se você não aceitar, serão lágrimas
do mesmo jeito).
sim, solidão, sim
enquanto longas escuridões
- lânguidas sombras -
estouram, em outros paraísos, malucas bolhas de universo.