Réquiem
REQUIEM
Vem, ó doce morte! Vem, cara amiga,
Me envolver no teu negro e etéreo manto,
Que estou banhado em sangue, em dor, em pranto,
E a paz desejo, companheira antiga.
Vem, bálsamo de luz na escuridão
Das incertezas transitórias. Traz,
Dos campos do não sei onde, algo mais
Que ungir possa este tão estreito vão
Que nos separa no éter-no ser.
Imponderável e mística estância,
Liberto da impureza e da jactância,
Eu quero, em teu regaço, adormecer.
Ai, que tua sombra já me trouxe alento...
Vem, que me encontrarás entregue e manso,
Que anseio, em teu infinito descanso,
Livrar-me deste implacável tormento.
Toma-me, sem delongas, no teu seio,
Maternal retorno, esperado e belo.
Vem! Me despe deste corpo em flagelo,
Carcaça com que os vermes banqueteio.
Ó lúgubre beijo consolador,
Teu hálito é suave e inodoro.
Bafeja este momento, que eu te imploro,
O teu inexorável esplendor.
Temor eu já não sinto ante o “funéreo’.
-Filha, esposa, a todos que ora deixo:
-Perdoem-me o impudico desleixo
-Com que me lanço aos braços do mistério!
Um halo, súbito, meu ser invade.
Dissipam-se crenças, fés e razões,
Aliviam-se dores e paixões,
Sobrevêm a inexprimível Verdade.
Deixo, àqueles que outrora foram meus,
No instante em que parto ao meu novo lar,
Uma só palavra, e hei de calar.
Que saibam: Já não sou... eu fui... a Deus!
Rio de Janeiro, 10/08 a 02/09/2001