Cavalo Marinho

Ambos com bom emprego

E uma filha pequenina

Enlace de amor e guerra

De uma paixão franzina

Entre o leito a reconciliação

O suspiro, um desejo contido

Ela premeditou um novo filho

Para satisfazê-lo então

Se emaranharam ao som dos céus

Se renderam as cores do arco-íris

Ela bailava em carrossel

E de emoção choravam sorrindo

Em seu ventre um novo ninho

Festejou aos beijos e carinho

Queriam muito aumentar a matilha

Era um novo ser, nova era - pura alegria!

A filhinha queria a irmãzinha

Ela queria Álvaro, Benjamin ou Theodoro

Ele queria Lucas, Larissa ou qualquer nome

Infinitamente eles queriam

Ela, gerente de loja, trabalhava até doze horas/dia

Fazia faculdade de Direito

Cuidava da casa, do marido e da filha

E dos problemas parentescos...

Receptáculo de tensão, stress, pressão, exaustão

Venenos científicos não comprovados ao embrião

Onde funcionava a descarga do corpo

Onde concentrava tamanha explosão?

Aconteceu o que é temido

Do encanto gestação

Sangue - elemento bandido

Do amor concepção

No hospital, atendida com urgência:

-Para ultrassonografia!

Ela olhava, olhava e nada via

Ele mordia os lábios em agonia

Dez minutos de silêncio...

A médica sem jeito, engasga e diz:

- Eu sinto muito!

- Parou de evoluir, o coração deixou de bater!

- Não há explicação!

E com todas as forças que reúne

Que habitam a sua mortalha

Ela grita, grita, grita:

-Não, não, não!!!

Ele segura a sua mão

Beija a sua testa

Em vão tenta acalmar

Com sussurros não ouvidos

A ela e a si próprio

Na obstetrícia, o médico diz:

-É comum, é natural o aborto inicial

-Como só tem 3 cm, tomará medicação para expeli-lo

-Cesariana é um processo mais traumático, dolorido

-Indico repouso absoluto, total!

Ela desaba:

-Meu filho pequenino

-Morto em meu ventre

-Como vou conseguir dormir?

-Se sou seu túmulo humano?

Ela chora:

- Meu filho já tinha alma?

- Já tinha sexo?

- Já tinha coração?

- Porque? O que aconteceu então?

Vai pra casa, ele avisa a família, os amigos

Ela só quer reclusão, não quer piedade

Ela fica três dias e três noites sem alimentar-se

Ela fica quase sem dormir e fala pouco

Apenas desliza a mão na barriga

Como quem pede um milagre

Murcha-se de tanto gemer e chorar

Desejava parir a vida e não a morte

Enfim, o alerta, cólicas imensas

Do corpo expelindo o corpo estranho

Que a levam imediatamente para o banho

Ajoelhada e contorcida - o inevitável

Algo cai entre suas pernas, como uva sem casca

Com o amor incondicional ela reza e observa

Na poça d'água escoando pelo ralo

Seu pequeno cavalo marinho.

Sheila Gomes de Assis
Enviado por Sheila Gomes de Assis em 05/07/2010
Código do texto: T2359800
Copyright © 2010. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.