MEU DELITO É O MORNO
PART 01
Senhor!
O morno há em mim.
E isso é como o purgatório,
E como um pecado puro,
É como um copo meio de água,
E por isso:
Há em mim um tormento
Um lago, uma ferrugem,
Um mofo,
Escamas soltas,
Um prumo torto
Um soluço seco,
Há uma cidade me consumindo.
Há um cais sem mar,
Há uma não religião,
Há um desejo voraz do nada.
Escada para baixo,
Graxa no sapato,
Rio de pedra,
Beco...
Tantos,
Muitos becos,
Becos... Becos... Becos!
Senhor!
Há em mim um vago,
Um entulho,
Uma manga macho,
Um tacho em éter.
De éter.
Há sempre um vento leve,
Um herege cristão.
Há um breve na imensidão.
Sem noite, mas escuridão.
Senhor!
O morno é meu corpo.
É brasa em manha de são João.
É asa, mas de pavão.
E por isso:
Há em mim um absurdo.
Galinha pastando no cercado,
Esse lado que dá pra tudo,
Morno em tudo,
Senhor?
Era pra te me feito,
Quente
Ou frio,
Não morno!
Morno não é santo nem vadio,
É um tormento,
Um vazio,
Morno, é nunca cair nem levantar,
É tá na beira e não se melar,
Morno é como a segunda feira.
Morno é esse relógio constante e sempre,
Segundo a segundo,
Morno é maquina,
Não é pessoa viva.
Morno não grita nem chora,
Não agita, ignora
Morno, senhor?
Sou,
E se á castigo,
Meu delito é de morno!
meu pecado é de morno!