PALHAÇO
A vida me envolveu em seu forte abraço
Minha carne com suas garras dilacerou
Esmagou meu corpo frágil em curto espaço
Meu ventre prenhe de esperança, desventrou
Com seu hálito de fogo fétido esbranquiçou
Meu cabelo tão enfraquecido e já escasso
Com mãos gélidas, tétricas, me agarrou
Cingindo-me para sempre ao seu regaço
Com seu olhar fantasmagórico paralisou
Meus músculos moles, flácidos do fracasso
E seu espesso sangue negro breu derramou
Cobriu meu corpo inerte do nojento melaço
À existência irreal, vegetativa me confinou
Sem que eu possa saber já aquilo que faço
Nas suas urdidas teias de morte me enredou
E fez de mim p’ra sempre um triste palhaço
1977