Escada para o paraíso

Hoje, aqui neste quarto, neste quarto de sempre

Apetece-me, alem de outras desumanidades

Ter uma escada para o paraíso

Tento em vão construir uma mas…

A madeira tenra dos sonhos verga frágil ao primeiro pensamento

Procuro, depois, nos ferros-velhos das religiões

Vou até para alem de Cristo, e mesmo no primitivo pagão

Só há ferrugem e restos (ainda cortantes) de metal

O Desespero (visita minha, já banal) vem chegando

E em vão, sempre em vão vou pisando os vidros

Das filosofias ocas (e demasiado lógicas, para falarem da verdade)

A campainha toca é o Desespero

Agora já juntos saímos de casa e o frio e a lua

Estranhamente são agradáveis

Vou por entre as calçadas dobrando esquinas sem mais ambição

Em gestos tão automáticos que são desumanos

Talvez por estar assim, vencido, perco o meu companheiro

Nunca me segue quando estou assim, o Desespero…

Continuo sozinho e depois de 665 esquinas

Encontro encostado o meu velho Desalento

Digo-lhe – Boa noite Sr. Desalento!

Na esperança inocente de que apenas me responda

Continuo sem olhar para traz o caminho que não sei…

Fingindo não ouvir as perguntas que o Desalento faz

(E faz sempre tantas e com tão poucas respostas)

Mais á frente encontro a Consciência

Sempre a Consciência, sempre irónica e feminil sussurra-me ao ouvido sensual

- Estás a escrever loucuras –

Sorrio (doem os lábios, talvez do frio)

Volto para casa em passos largos e sonoros

Encontro o conforto do meu quarto

Depois mais calmo, revejo a minha agenda

Os meus compromissos…

Recordo triste que era hoje o dia de arranjar a minha escada para o paraíso

A campainha toca [sei quem é…]

Vou-me deitar…

Tiago Marcos

(= Escrito a ouvir a musica "Stairway to heaven" dos Led Zeppelin =)

chomanno
Enviado por chomanno em 26/10/2006
Código do texto: T274000