SEXUALIZAÇÃO - POEMA 89
EU ESPERAVA A MORTE SUPREMA E VEIO O SEXO.
UMA NOVA GRAMÁTICA DE PELE E CHEIROS MARINHOS,
VÃOS TERRENOS E SONHOS PECAMINOSOS.
ALTARES SEM MEDIDAS OU PRUMOS!
A LUA BELA RESERVADA AOS MOUROS , LEVITA, HUMANA.
NOS RELEVOS E MORTALHAS DE UM DOBRÃO DE OURO!
APROVEITE-O! É TEU !
CRESCEI VOS EM AMORES, OH HOMENS! OH MULHERES!
QUE PELO SEXO DEIXAM-SE , SEM SENHORES, A GOVERNAR!
TUDO É UMA QUESTÃO DO TEMPO, DA HORA ACERTADA.
ASSIM NÃO A É PARA O AMOR , A MORTE OU A TUA SORTE.
MAS A É PARA O DEVANEIO DO PRAZER!
PARA QUE A HORA , AGORA CERTA, NENHUM FALTE!
PARA O GÔZO DA PRIMAVERA, DAS CORES E DAS ARTES.
PARA QUE NINGUÉM A INCOMODE. E O DESACATE!
A AMBOS, MALTRATEM!
HÁ QUE SE ESPERAR O VERÃO, O OUTONO. O INVERNO.
SÓ NO APAGAR DO CREDO, PARA TI NASCERÃO AS FLORES.
MAS HÁS DE ESPERAR. ESPERAR, ESPERAR.
SACODEM-SE TODAS AS CINTA-LIGAS E OLHARES.
ESPUMAM-SE AS NUVENS EM DELICADOS LICORES DE MEL.
MAS TUDO É TÃO RÁPIDO E SILENTE MOVE-SE O CÉU.
O CÉU TAMBÉM UM DIA AMOU E NINGUÉM SOUBE QUEM ERA.
QUE IMPORTÂNCIA OS DEUSES DÃO A TI?
NENHUMA, APÓS SACIADOS !
A VIDA É BASTANTE FEITA DE RELÓGIOS VIVIDOS.
MAIS DE RELÓGIOS DO QUE DE QUIMERAS.
VÃO AQUI RUSGAS E LUAS BRINCANDO DE FADAS APRESSADAS.
VÃO ALI HOMENS E MULHERES BRINCANDO DE SEXO.
OS OBSERVAM DISCRETAMENTE, EU E LISBOA.
A VIDA VOA EM ESPIRAIS E SEM NENHUMA RAZÃO
APARENTE.
HÁ OS QUE SE FARTARAM. HÁ OS QUE TUDO PERDERAM.
HÁ OS QUE TUDO APROVEITARAM.
OS QUE TÃO POUCO PERTO CHEGARAM.
INUSITADOS. DESCONFIADOS!
E PÁLIDOS, FALIDOS, VAMOS TODOS SEGUINDO ESTA VIDA
VAI UM PADRE EUNUCO, CORRENDO E REZANDO A MISSA.
DESDE QUE O MUNDO É MUNDO, OS ASTROS CINTILAM.
TUDO MUDA MUITO, MAS NADA SE MODIFICA!
NA LISBOA DE 1920 ERA ASSIM....
NA MÁQUINA DO TEMPO UM DIA OUSASTES ENTRAR.
ENAMORAR-SE NAS TREVAS DO QUE RESTOU DE MIM.
EU SEMPRE TIVE MAIS CONTAS FINANCEIRAS DO QUE SEXO.
EU SEMPRE TIVE MAIS POESIAS DO QUE PERNAS.
AO APAIXONARES POR MIM. PROVASTES A LOUCURA .
TÃO POUCA MINHA E TUA, TÃO INFINITAMENTE
TU NÃO CONHECES SEQUER OS SEGREDOS DA ALMA TUA.
NÃO TENTE SONHAR OS SONHOS QUE LEVO PELAS RUAS.
NÃO TENTE SUBTRAIR DO TEU SEIO, O VINHO JÁ MORTO.
NÃO TENTE SOMAR AO PORTO, O QUE É TORTO
EMBORA TE SEJA , GENTIL!
SÃO DENTES E PARTO PARTIDO.
UMA RUA NÃO É MASCULINA OU FEMININA, APENAS RUA.
A ALMA NÃO POSSUI O SEXO QUE A SOMBRA DETERMINA.
O QUE VAI PELAS RUAS É O QUE VOCE SIMPLESMENTE AVISTA.
MAS NÃO CONHECES NADA DO UNIVERSO QUE O HABITA.
SOBRE MIM, LISBOA ESPECULA!
HABITA EM MIM, SIM, O FRÁGIL VIDRO DE UMA FARMÁCIA.
DE UMA QUIMICA PERDIDA NA RUA DA TABACARIA
ENCONTRADA NOS SEIOS DA MULHER AMADA E NÃO TOCADA.
QUE NÃO SENDO POR MIM, POR MIM É AMADA EM
TODAS AS SUAS ETERNIDADES.
TUDO SE PERDE LEVEMENTE EM MIL SERES.
NO SOL TODO ELE SE DESPEDAÇA, QUANDO O TENTAS
NÃO HÁ CAMINHOS PARA SEGUIRES AO MEUS LADO.
MAS É TEU TODO O MEL QUE ME PERTENCE.
CAMINHO E MEUS PASSOS VÃO SOMBRIOS.
VÃO PERSCRUTANDO OS RIOS QUE FINDARAM EM MIM.
AQUI E ACOLÁ, MIL SONHOS ME VAGAM, ILUDEM A NOITE.
NENHUM DELES, COMO TI, OUSAM ME CONCLUIR.
DOU-ME AO QUE SOU EM RUAS SEGUINTES.
EM RUAS AINDA NÃOS NASCIDAS, SEQUER HABITADAS.
A POESIA QUE HOJE FAÇO MUDA, AMANHÃ SERÁ FALADA.
DESFOLHADA COMO UM RAMO DE ALECRIM.
FAZER POESIA PRA MIM É SEMPRE MAS FÁCIL QUE FAZER SEXO.
NELA PODE HAVER SOMENTE O TROPEÇO DO VERSO.
MAURICIO DE AZEVEDO
LIVRO- METEMPSICOSES " A ALMA DE FERNANDO PESSOA "
POEMA 88 - SERIE DE 120
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