RESTRUCTUR & o ESPECTRO DE MOMENTO
Espectro de momento
Passei anos para te descobrir
Até as cervejas já estarem mornas
E os jantares sempre frios
Houve até alturas da minha vida
Que a felicidade simulei
E se de te procurar deixei
Foi com medo que não fosses real
Mas já fazia parte de mim a demanda
Era dos meus desejos o principal
E se eu morre-se da procura
Morreria pela aventura
E pela esperança de nascer de seguida
Para poder procurar mais numa outra vida
Pois és o meu melhor motivo
Desde a tomada de consciência do meu pensar
Numa noite de insónias e suor
Dentro de mim senti que estavas só
Sem mesmo saber quem tu eras
Meus freios deram um nó
Contorci-me em agonias severas
Perdi o sentido que me conferiram á nascença
A lógica em situações de conveniência
E dos meus olhos á tua rua
Cresceu uma praia virgem e nua
Para poder a ti chegar
Pela primeira vez te consolar.
Ferve o músculo queimando o sangue
Como se a fugir da prisão.
Não tão forte coração
Que de ânsia me queres matar
Se meu peito não queres partir
Detêm a marcha desassossegada
Para o meu destino tenho de ir
Antes da estrela da alvorada.
Volveu a noite e fez-se manhã
Estavas a meu lado, alegria sã
Nunca acordará com um sonho
Nunca uma mulher se assemelhou a um anjo
De gravidade e feição perfeitas
E não sei se asas escondias no vento
Ou se de vento eram elas feitas
Induzi que fosse um espectro de momento
Mas a aparição me dissolveu no ar
Embarque surpreso, bem real
Angelical modo de voar
Para uma sensação de apaziguamento
Bem perto das portas do céu aprazível
O mais perto que poderei algum dia estar.
Com a calma que me permitiu o momento
Provei-te com os olhos, as mãos e a boca
Imoderados sentidos de aptas paixões
Que atraídos queriam agarrar-te e medir-te
Anunciar aos elementos tua pele nua
Deleite, colhido na orbita do sol e da lua
Arrebatou todo o meu corpo viroso
De tão bom que era doloroso
Que teria de voltar a nascer para aprender a senti-te
Prodígio grande, pasmo forte
Volúpia quente, um astro de luz
Que até o eterno sol suspende e seduz
Oprimido por vis vibrações de prazer
Duas noites passaram para voltar a nascer.
Tempestade de trevas
Foram 48 horas de escuridão
Cinco dedos largaram os freios da aventura
Demanda já não tão segura
Cinco dedos que se agarram á mão
Cinco sentidos tremendo receios
Medo que fosses uma só ocasião
Espectro de momento
Que amanhã fará acordar sozinho
De novo… pavorosa condição
Oprime e caça a alma
Ajuda a mágoa a conquistar a razão
Perdida num pensamento
Que te posso perder
Sem mesmo antes te ter.
Extinguiu-se o sopro no coração
De quando e como uma declaração
De quando o silencio só se finda
Se mais alto penso ainda
O que a dor é capaz…
«Peço-te por favor não vás!»
Se fores uns olhos por ti ficaram tristes
Os mais molhados que vistes
Aconteceu comigo sem me aperceber
Apaixonar-se não é ter consciência do que nos está acontecer
Dou o sangue e o sono
Tudo o mais que ambiciono
Do penar de amante
Para reter mais este instante
Tudo que ambiciono é tua vida
Dela não quero perder mais
Estive longe de ti tempo demais
Por isso peço-te que não vás
Faz rezar o resto da história
Não se tornes numa memória
Mas em vida todo os dias
Em sol que todas as manhãs brilha
Numa almofada vizinha
Chegada á minha.
Miguel Lopes
LXXXIV