verdade
literalmente
ela chegava sorrateira e nua
dama convertida na palidez dos fracassos
moça velha ainda crua
sem sabor delicadeza
quão malvada é a vida!
pescoço pobre de cordão
sem ouro medalha só pele
reveste a alma vazia
na lama sem aceitar o destino
é a vida tão malvada!
mãos grossas feito tantas de estiva
cabelo despenteado
roupa suja já rasgada
ventre aberto é tudo ou nada
cospe o filho que não pariu
e malvada foi a vida!
pela pele enrugada
os sinais da castigada
sina triste de um sol
sol que queima até cratera
esculpida no rebento
onde a sede é mais faminta
sem sombra sem água sem dó
e foi-se a vida malvada
na espera da esperança
titulo maior sem fim
cinderela sim, coitada,
ventre nu boca estreita devassada
na margem do seu alento
príncipe nenhum chegou
e a vida malvada foi-se!
dos sonhos incandescentes
reluzem faiscas dormentes
daquelas pernas tão frias
corre às noites fugidias
e se esbarra no lençol
ouve enfim a voz que grita:
"acorda maria bonita, levanta pra fazer o café"
e o sorriso ainda sujo
da noite lambuzada e sedenta
desperta a alma pequena
é hora de trabalhar...