OUVI UM GRITO

OUVI UM GRITO

No beco ouve-se um grito;

Ninguém conhece sua voz;

Ninguém viu.

O seu lugar não estava lá.

Os humanos andam apressados;

O tempo não tem tempo.

É tempo de escassez de tempo.

As cidades não tem lugar para as pessoas.

As coisas reinam há muito tempo.

Ouvi falar de alguém.

Seu nome não tinha crédito.

Ele estava distante.

Parece estar do outro lado onde não sei.

Onde estamos então?

No mundo dos nossos sonhos diz o poeta.

São sonhos muitos.

Sonhos que se transformam em formas.

Formas que rasgam o espaço e o tempo.

Formas deformadas pela luz de neon.

Eu quero ver o sol direito.

Quero acordar seu calor no peito.

Sentir novamente sua luz pelas manhãs.

Até que velho, converse o poeta, com suas cãs.

- Veja que os filhos dos homens construíram cidades na beira dos rios!

- Veja que os filhos dos anjos fizeram máquinas que ao negro espaço vão!

A era do aço.

A era do chip.

Contudo tem gente morrendo de frio.

Tem criança sem pão;

Tem, no nariz, secreção.

Teus velhos ainda morrem de gripe.

Os abutres confessaram: “Os homens são irmãos da morte”.

- Sofrem os filhos do barro triste sorte!

As risadas embaladas pelo vinho ou pelo ópio se calam ante ao fato: Não há tempo!

- Poucos são os dias; a vida parece ser um breve momento!

Corri de manhã cedo e plantei um jardim nas bandas do norte.

Cuidei logo com muita pressa; e fiz filhos.

Minha mulher enrugou-se como uma folha de papel descartada.

E meus ossos ficaram fracos.

- Os sofrerei até o dia de meu óbito!

O sentido faz sentido pela força das escolhas.

As escolhas são veredas que nos levam ao mesmo lugar.

O teu sepulcro falará por ultimo;

Dirá combalido o teu sepulto irmão: Veja a recompensa das minhas escolhas!

Se eu tivesse uma borracha do tamanho do mundo.

Eu apagaria tudo, tudo que foi dito dos homens.

Daria a mim uma chance de escrever novamente.

- Escrever num mundo vazio, solitário?

- Destruir o tempo e o espaço não acaba o mundo!

Foi a fé de Raimundo;

De Paulo da oficina;

De Guilherme, um funcionário;

Que me disse: O mundo é teu!

- Meu?

- Deixe-me comer todo dia!

- Deixe-me encher a barriga vazia!

- Deixe-me chamar a justiça e a misericórdia!

A primeira é a mais jovem, a derradeira é a irmã mais velha.

O mundo é teu até onde podes.

O mundo existe nas nossas pupilas.

É como massa, ou argila.

A sábia e perita mão dele zomba: Qual será tua forma no próximo verão?

Ah, se eu pudesse dar-te uma forma; poria em ti meu espírito!

Tu viverias minha sorte. Que se danem os outros!

Cada um tem sua morte.

Cada um tem seu mundo.

Eu me calo ante a ganancia presa em minhas entranhas.

De onde ela vem?

Não sei!

- Não será do mundo?

- Não será do tempo?

- Não será do barro?

- Não será da forma?

No beco ouvi um gemido.

Procurei de onde vinha.

Não encontrei o seu lugar.

Roosevelt leite
Enviado por Roosevelt leite em 15/02/2012
Código do texto: T3501779
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