Entre o pensamento e a natureza,
terra em douradas curvas,
tempo de cortejo.

Conservo,
sempre à solta,
a minha alma romântica,
em tecido de sonho morno.

Nas veias, o sangue,
perseverando na mesma trajetória,
campo de cultivados espinhos.

À beira da pele, célula,
inútil patrimônio
que já se fez outono.

Ah! Quase dissolvida pela vida,
sou ainda fúria!
Ponte para a loucura,
na posição de me desfolhar em flor.



                                      ***      *** 

 
                               Comentário do Jô:
"tempo de cortejo" - propicia uma impressão de cortejo fúnebre, tão ao gosto da poetisa.  Original.

"em tecido de sonho morno" – “de sonho morno” dá uma dimensão de tecido espiritual, feérico, pano (estampa) celeste; e "sonho morno" é uma sinestesia - ou algo mais, que não diviso agora, nem talvez nunca. Uma expressão onírica, navegante por dentro, barco desgarrado. 
 
"inútil patrimônio 
que já se fez outono" - aposto, aliás belíssimo, cativante em sua tristeza anunciada.  Estes versos fazem referência ao envelhecimento inexorável do corpo, percebido pela alma perplexa.
 
"(Sou) Ponte para a loucura" - metáfora.
 
"na posição de me desfolhar em flor" - verso tão simples quão enigmático, guerreiro ante o combate final.




Enviado por Jô do Recanto das Letras em 10/03/2012
Reeditado em 03/11/2012
Código do texto: T3546198
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