A carta

Escrevi para ti também hoje

Mas logo chamei o carteiro adentro

Repensei tantas vezes o que te contar

que ele ficou meio confuso

e foi-se embora sem levar a carta

Carteiros já não são o que eram

e por cima queixou-se de meus envios

de eu ter enviado venenos por ele...

Venenos...? E como é que ele sabe ?!

Éhhhhh carteiros apercebem-se de tudo

mesmo eu enviando sempre ocultamente

em envelope de ventre riscado opaco

que guarda direitinho os segredos...

A carta de hoje continha só uma linha má, a primeira

era de veneno concentrado desse dos desertos

e nem me deu tempo a eu riscá-la fora

o carteiro foi-se sem terminar o seu café

esse carteiro era pior que o de Neruda... !!

Nunca saberá que o que restava era pura seda

com a que eu embrulharia a alma tua

ate passar-te o calor todo de mim...

e derreter os invernos do teu corpo

Mas não adianta agora eu me queixar

o carteiro partiu e comigo ficou a carta

misturando chuva com poesia e insonio

O que fazer agora com a minha carta ?

ou será que a carta é tua ?! pergunto-me...

Não sei, já ouvi dizer que há quem as come

outros queima-nas em solitário ritual...

Mas como destruir tanta beleza. .. ?!

tanta palavra que arranquei da minha pele

para te ir cobrir a ti com flores únicas...

É....

talvez a chuva, talvez a chuva...

se eu deixar a cartinha dormir na rua.

Concha Rousia 28/10/13