OBSESSÃO MACABRA

“Quem tem boca diz o que quer; quem tem ouvidos ouça." Mas "quem diz o que quer ouve o que não quer.” São máximas populares e sempre oportunas a quem “joga a pedra e esconde a mão”. As “palavras duras em voz mansa” são armaduras dos covardes que temem dar “cara à tapa” e assumir as consequencias dos próprios atos. E, como “todas as ausências são atrevidas”, a insolência encoraja uma pessoa covarde como a arma torna qualquer um valente. Afastado do Recanto das Letras, a obsessão macabra ainda se volta para mim. Gente desocupada e infeliz que se dedica exclusivamente a essas imprecações. Mas cuidado! “Prepare-te, pois aí vem chumbo grosso”. "Dá nome aos bois” e “Te entrega corisco”.



A MULHER

Um arrepio estremeceu minh’alma.
Um rasgo de mortalha rompeu-me a medula;
Lavas de fogo a rescender enxofre
Na mão onde o punhal em punho à palma
E, com a língua solta à linguagem chula,
A mulher guarda a moeda maldita no cofre.
Repentinamente,
Um odor de gambá por entre as gentes
Vem num ranger de dentes,
E no vento se avulta
Alguém que me insulta
Na dantesca cena
Sem qu'eu dê fé,
Naquela geena,
À mulher de Lúcifer.







A desarrumação dos intestinos
Assombra! Vede-a! Os vermes assassinos
Dentro daquela massa que o húmus come,
Numa glutoneria hedionda, brincam,
Como as cadelas que as dentuças trincam
No espasmo fisiológico da fome.
- Augusto dos Anjos –




ABUTRE

Livres o vento
E o pássaro pensamento
No instinto do abutre
Que o nutre.
Verte a gosma do espasmo,
Vísceras no vômito
Do ser animal
Homem bestial
Indômito.
Livre a lira
Na letra que inspira,
Afeta e desafeta
O poeta.
Ave de rapina
Voraz, feroz, assassina,
Mete o bico, iça
A carne, a carniça
Que a seduz
E cheira, e prova, e come, e deita,
E dorme satisfeita
De carne e de pus.
Depois, farta do fardo estorvo,
Finge não ser um corvo
E, numa golfada de fel,
Expele num branco papel
Uma jorrada de amor
Como se poeta fosse, ou se fizera,
Condor.



NAS TORRES SECULARES

És originalíssima pessoa
Do verbo singular, pronome ego,
Não és o virtuosismo que eu carrego
No uso coloquial da prosa à toa.

Não tenho a realeza da coroa;
Vim do Latim vulgar, jamais do Grego,
O posudo obtuso, como um prego
Na língua afinada que não soa.

Mas o meu verso é címbalo que tine
Além do vil metal em bronze ou ouro
Nas torres seculares das igrejas.

Por isso eu peço a Deus que te ensine
Na vida avaliar o teu tesouro
Dando-te em dobra o que tu me desejas.
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LordHermilioWerther
Enviado por LordHermilioWerther em 25/11/2013
Reeditado em 26/11/2013
Código do texto: T4585672
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