Me empresta

Vai, me emprestas as mãos!

Pelos seus dons irei tocar.

É mais do que amar poderei sentir pelo tato,

Os fatos a relatar.

Me emprestas teus ouvidos.

Quero ouvir alaridos.

Os sons e tons que envolvem meus sentidos.

Sortidos são todos bem vindos,

Emanados como dádivas.

Me emprestas teu cheiro.

Melhor, corrijo ligeiro, teu olfato.

Pelas flores, pelas comidas,

Pelos perfumes e os dia a dia de bons tratos.

Ha! Seus tatos delicados.

Me empresta teu ser, teu querer, teu sentimento.

Te juro, devolvo, não lhe absorvo.

Só quero por um momento.

Ha! Teus olhos, arregalados.

Faceiros, arredondados, ligeiros.

Por um minuto, discretos resolutos.

Me emprestas para ver novamente.

O que deveras vivera no passado, somente.

Depois deste empréstimo te abandonarei.

Seguirei como sempre segui.

Tudo o que persegui do mais puro ao ingênuo.

O dever de ser pequeno, mesmo antes de existir.

De ser impuro por persistir.

De ser ignóbil e sem cheiro.

Sorrateiro tal nevoeiro,

Sem nenhuma saudade de ti.

A recíproca será verdadeira.

Numa nevoeira sem fim.

Deixaremo-nos eu e você de mim

Para sempre, como decisão derradeira.

Minha alma, tua alma.

Lugares distintos como esquinas de um labirinto.

Sem vontade de encontrar-se.

Sem vontade de partir.

Chácara das Roseiras, Bagé-RS -2013