A Tela

E agora se à tela

não há mais o que pintar?

Usasse o vermelho sangue, o vermelho dor

E misturasse ao verde

Verde dos olhos de esperança e medo

Não.

Seria como outrora repetisse a gravura

Da já cansada figura

Triste, que já não quer mais ser mais só.

E se de repente riscasse o céu

Da mais linda estrela cadente

E dela fizesse o desejo.

Aquele de tantas outras estrelas

Dos terços e das promessas

De tudo de novo.

Talvez fosse hora

Do amarelo incandescente

O da luz

Que de tão puro e tão intenso

Cega os olhares alheios,

Esconde o riso, o choro, o sonho.

E eu?

Onde fico eu na tela?

Quiçá na tinta das coisas de sempre

Mais certo na dúvida

O que agora devo pintar?

Sim.

Devo pintar.

Da tela do meu ser

Faz-se ver e admirar

Ainda que pelo pincel da monotonia

A vida.