Tratado do Tempo
Saber do tempo
É saber dos temporais
Que nos assolam.
O tempo sempre foi novidade para mim
Com seu jeito amiúde de atravessar o presente
De mumificar os fatos já consumados
No seu ar arrogante de um viajante
Que conserta o pretérito imperfeito
Com a visão permissível dos ventos
Que, de repente, escapam dos futuros possíveis do passado
Para recompensar horas perdidas de sono
Madrugadas criadas pela força dos vícios
E eis que então o sol massacra a noite... De novo.
O tempo nunca anistiou de forma devida
Para encontrar entre todos os rebeldes
Aqueles que justificaram suas vidas
E delinearam roteiros outrora inteligíveis
Para destronar o amanhã dos reis
Que agora ocupam tronos obsoletos
A serem desfeitos pelas enxurradas das águas
Advinda de cada gota de lágrima honesta.
Os grandes ciclos ditando regras aos menores
Promulgando de novo a grande lei que se renova.
O tempo agora conta uma nova história para mim
E seu diadema fica pairado a alguns metros
Do que seria aquela porta que nunca ousei entrar
A joia é cruel e constantemente diz
Verdades que não precisamos ouvir
Verdades que só tem sentido contra a mentira dos dias
Que se resumem normalmente aos nossos sentidos
Ao nosso mais mortal sentido
Aquele que nos leva, que nos garante sobreviver
Em todas as horas de relógio que nós contamos
Que ficam girando em nossas cabeças.
Entrementes, por um momento, achei o tempo muito velho.
Um momento tão curto que eu não sei
Se ele pode ser registrado no tempo.
E por fim o tempo sempre me aterrorizou
O badalar dos relógios que eu ouço sem paciência
Um tique-taque que me mostra crocodilos
Que me lembram de que deverei cumprir minha sina
Nas sombras que se alongam para as noites
Para os tempos que sentirei frio
E só uma lanterna bem distante
Provisoriamente me aquecerá
Uma luz tão tênue tão lenta
Que por seu vagar não é mais uma luz
E esta forma me deixa afinal dizer
Sobre o meu modo de entender meu tempo.