MOS-CA-TEL
O Eduardo vai sempre à lousa.
Formar frases.
Eu vou de castigo.
O nariz grudado no ponto de giz.
As pernas doendo com vontade de sentar.
O Eduardo sempre ri quando volto à carteira.
- Tô de mal.
- Belém, Belém, nunca mais ficar de bem.
- Mariquinha!
VÓVÓ VIU A UVA
- Que vovó?
- A sua.
- A minha?
Nunca tive
- A uva é moscatel.
Parece um ovo,
só que menor
e vem em cachos.
- Cachos?
Como os cabelos de Luciana Taveira?
- Você nunca chupou uva moscatel?
- Acho que não.
Eduardo abriu a lancheira.
- Rá-rá-rá.
- Tô de mal.
- Belém, Belém, nunca mais ficar de bem.
- Mariquinha!
Ovos verde-amarelados na mão de Eduardo.
Só um chegou à minha mão pidona.
Quando o cacho já parecia uma árvore sem folhas.
A doce clara escorreu como cachoeira da minha boca.
Parece jabuticaba só que tem mais água.
E a pele é fina,
fina como a de Luciana Taveira
mos - ca - tel
moscatel
É fácil aprender o que é doce.
O ditado colei do Eduardo,
mas nem o castigo, o cheiro de cal na lousa,
não me tirou da boca o gosto da uva.
Vovó teve ter tido muita vontade como eu,
de chupar a uva e não se importar
se o castigo na lousa doeu.