O pH DA LÁGRIMA

Jamais nos conheceremos de todo,

ainda que nos encontremos todos os dias

e passemos juntos todas as horas

conversando sobre todos os fatos,

compartilhando cada sentimento,

dividindo cada refeição

e dormindo na mesma cama.

Temos cada um a sua face oculta,

dissimulada a cada gesto antigo.

Ainda que nos expressemos sempre,

nunca o faremos de todos os modos.

Haverá frases não proferidas,

palavras abortadas,

sonhos construídos e dissipados.

O fingimento é uma couraça de cambraia.

Meu próprio coração me é um estranho,

Tamu Massif, adormecido e submerso,

sem garantia de que não irá irromper um dia.

Tornemo-nos uma mistura azeotrópica

e ainda evitaremos nosso ponto de ebulição.

Nossa natureza continuará se movendo

silente sob uma ponte de hidrogênio.

Um de nós acordará à noite

ofegando suspiros abafados

e desconhecerá quem dorme ao lado,

secará lágrimas incontidas antes que alcancem o lençol,

na única e leniente certeza de que, do outro,

terão o mesmo pH.

Asael Souza
Enviado por Asael Souza em 25/09/2014
Reeditado em 07/10/2014
Código do texto: T4975535
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