O pH DA LÁGRIMA
Jamais nos conheceremos de todo,
ainda que nos encontremos todos os dias
e passemos juntos todas as horas
conversando sobre todos os fatos,
compartilhando cada sentimento,
dividindo cada refeição
e dormindo na mesma cama.
Temos cada um a sua face oculta,
dissimulada a cada gesto antigo.
Ainda que nos expressemos sempre,
nunca o faremos de todos os modos.
Haverá frases não proferidas,
palavras abortadas,
sonhos construídos e dissipados.
O fingimento é uma couraça de cambraia.
Meu próprio coração me é um estranho,
Tamu Massif, adormecido e submerso,
sem garantia de que não irá irromper um dia.
Tornemo-nos uma mistura azeotrópica
e ainda evitaremos nosso ponto de ebulição.
Nossa natureza continuará se movendo
silente sob uma ponte de hidrogênio.
Um de nós acordará à noite
ofegando suspiros abafados
e desconhecerá quem dorme ao lado,
secará lágrimas incontidas antes que alcancem o lençol,
na única e leniente certeza de que, do outro,
terão o mesmo pH.