SEM PATRIAS NA LINGUA
Onde assentar a pátria, no corpo ou na mente,
se os nossos mortos não tem os milênios
de uma civilização talhada na pedra
e banhada no coado sangue?
Se os nossos bárbaros, morrem
miúdos, irredentos, contemporaneamente.
Como se ir, e para onde, se as estradas
não vão ao passado remoto
e espremidas pelas cordilheiras,
afundam-se nos mangues, antes que no pleno mar?
Se o verbo nacional, que pretende adicionar,
distorce a auricular beatitude canônica,
da língua mãe de Camões?
Se a seiva da vida nos Trópicos, ainda melíflua
desde Alencar, está tão longe dos Pirineus?
Se a imaginação se expande e justifica-se,
para na busca do Bom Sauvage,
de novo, nos europeizar.
Se na selva verde e densa, a alma da pátria
aprofunda-se e nos infunde o medo
de vermos refletidos em nosso gen, o arremedo,
que nos faz assim sem eira,
bastardos, perdidos rastacueros, aborigenes,
sem sombra que nos refresque,
como nas margens do Sena, na relva.
Estamos vestidos em elegantes ternos Armani,
como antes, iam os mortos de sobrecasaca,
drumondianamente, passear num calor visceral.
Ricardo S. Reis