Criação

No meio do dia, o tempo é escasso,

O Relógio me chama.

Mas do limbo me vem uma coceirinha,

Bem na ponta dos dedos,

É sede de escrever!

Pega o papel a caneta,

Ou o giz de cera, tanta faz,

Qualquer coisa que exprima,

Uma maneira de dar vida à criação.

A mistura de palavras parece correr

Pelo sangue, dos pés à cabeça,

Da lua à aurora.

Tentações disputam ,

Todas desejando ser as modelos de meu ilustre desfile.

O coração, romântico como só,

Tenta induzir o lúdico poeta a lembrar de seus amores,

Botar no papel tudo o que de si não pode tirar,

Revelar seus maiores segredos,

Passando a noite a chorar de saudade.

O sangue literário,

Também passa pela mente,

Pela senhora sensatez, juíza de nossos carmas.

Esta ordena que eu liberte o mundo do fundo do papel,

Que exponha as cidades,

As árvores,

O rio...

Que eu fale de politica,

Da honestidade paralitica,

Presente neste nosso sistema.

Os dedos continuam a coçar,

Neste singular tique nervoso,

Que me parece tão estranho,

Que me tira da cama, para então versar.

As palavras caem, mas frases não saem,

As frases se formam,

Mas estrofes não mais.

As estrofes se calam,

O corpo se confunde.

Esta briga de sentidos

Embaralha a criação.

Coração ou mente?

Razão ou loucura?

Sim, estes são eternos antônimos,

Irmãos de castas opostas, porém não inimigas.

Sem cantiga, sem tinta no verso,

Que está sempre na fôrma esperando a massa do criador.

Sem morte, a vida correu nos olhos,

Porém o papel correu com o vento,

E o relógio já despertou,

Sem dose, sem suor, o sustento.

De hoje a coceirinha nada adiantou.

As mãos terão de dormir sem o sentimento

De terem marcado história,

E a essa hora,

Os antônimos estão satisfeitos,

Por terem feito,

Do poeta louco ,

Tão mais tresloucado.