ALINHAVANDO O TEMPO
Nos dias retalhados,
a linha não salta dos olhos,
ela custura por dentro,
remendando o que parece
não ter concerto.
São mãos apalpando
algo que ainda possa estar seguro,
que não tenha vazado nos poros
na forma de lágrimas.
São linhas de um desenho
num horizonte tão longe,
de uma luz minguante
num pavio atrofiado,
submerso na pasta do estômago.
Uma vontade de expelir
os pensamentos indigestos,
alinhavar longe de si,
os retalhos puídos de cada dia;
ilustres pensamentos
dignos de defecção.
Se os olhos não conseguem
ver a linha do tempo,
nem pontuar as horas do fim,
torna-se imprescindível
olhar para dentro mais uma vez;
encontrar-se, auto-examinar-se,
alinhavar outros remendos,
longe do pano presente.
...
Pedro Matos