Ralo

Ela vai embora

Faz as malas e

abandona

o tempo que passou

deixa o vazio

do que não aconteceu

e uma lágrima escorrendo

sozinha

silenciosa

acompanhada da avalanche a rolar em seguida

um monstro a devorar

jogar na cara

passou, acabou, desceu pelo ralo

o futuro talvez exista

mas aqueles dias, aqueles dias que você bem sabe

que tanto viu passar

da sua janela gradeada

que tanto esperou e desde sempre

desde feto

soube

que apenas passaria

a rotina

o cotidiano

podem ser sufocantes

entristecedores

precisa-se de um livro

um amor

aquela música

algo

que me complete

além do que tento

me completar

nessa existência

vazia

uma melodia que complete essa vida

medíocre de espera

triste de passagem

desculpa, querida

eu tentei

mas o líquido foi mais forte

e hoje vejo, percebo

como foi rápido, quase instantâneo

só me resta o agora

o hoje, os 365 dias seguintes

para fazer algo

sem me afogar em meio às lágrimas

às regras de português, às responsabilidades

às fórmulas

incoerentes

mais coerentes

que tudo isso

que os anoiteceres e amanheceres

assim, rolando

junto da avalanche

que esfria o que não é frio

que mascara o que é maior

tentando se proteger

e sobreviver

por si só

sem se afogar