Ode ao Inimigo
meu inimigo tem duas faces
e é assim tão familiar
como se de repente surgisse
lá do fundo do quintal
caminhando com displicência
por todos os sagrados recintos
de minha consciência
sem dizer uma palavra
seja de bem ou de mal...
meu inimigo só me espia
com seu olhar de tigre
o belo corpo retesado,
sempre pronto para o salto..
em momento inesperado
e seu olhar abrasador
muda do ódio para o amor
com a maior facilidade.
meu inimigo faz-me chorar
e, outras vezes, sorrir...
as vezes é um demônio,
outras vezes um anjo também.
se reza, não sei pra Quem.
e se o mal o domina
logo mostra algo de humano.
meu inimigo me espreita
como bicho na floresta
e de repente, me empresta
por pura condescendência
uma fugaz confidencia...
que me faz cúmplice
mesmo sem querer..
ah..meu inimigo é a exceção
que invade meu coração
adivinhando-lhe as sombras...
cumprindo um difícil papel
que um amigo não cumpriria.
E,quando lhe peço arrego
ele me põe a correr..
sem dizer-me o que fazer.
mas, pensando bem...
onde mais encontrar
esse olhar de lince que, em silêncio,
devora meu poema...
sem nenhuma compaixão
sugando-lhe toda essência?
onde mais encontrar
minha humana contradição
guardada com tanto cuidado?
ah...todo mundo devia ter
um inimigo assim ao seu lado...