Palco e poeira

Quando se cerra a cortina do dia

e se encerra a cena da noite vazia

sem aplauso, eu encaro:

Quando haverá um espetáculo?

O homem acorda, levanta.

Às vezes trabalha.

Às vezes se importa.

Às vezes ama.

Às vezes é até bom.

Mas o homem dorme, descansa,

e é só outro homem.

Quando as cortinas do dia se fecham

Essa coisa me come as entranhas.

O estar feliz, ou amargurado,

o estar exausto,apaixonado.

Estar sereno,e o sereno.

A sala de estar,a mesa de estar

Mas nada, nada.

Nada passa esse mal estar.

Um estar,o eterno estar:

Vazio.

Desde o primeiro ato, eu adiciono.

Engulo novas faces, conversas.

Degluto arte ,ciência, vivência.

Ingestão de emoção.

(Há quem joga dinheiro pra dentro

todo dia.)

De modo que eu esperava uma congestão.

Mas quando a cortina do dia se fecha

eu me abro depressa,e encontro

muito, tanto, farto, abundante,

um superexorbitante:

Vazio.

E eu não consigo, não respondo.

A morte significa a vida.

Mas designifica todas as coisas.

Tudo que eu engulo de garfadas

em dias,em sonhos, em poesia

é poeira no palco do mundo.

Sem destino, só jornada.

E eu me sinto lotado,

nutrido, mas não saciado

Desse fardo, desse fado:

Vazio.

Um palco vazio.

Um espetáculo, sim.

Mas sem nenhum sentido.

Hygor Marques
Enviado por Hygor Marques em 21/06/2017
Reeditado em 27/06/2017
Código do texto: T6033041
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