CONTRASTE

Contraste

Em minha casa, em cima de um morro torpe.

Debruçada no parapeito da janela de um barraco torto,

Observo as cenas de um mundo morto,

Um mundo sem vida e insólito.

No contraste da paisagem linda da cidade maravilhosa,

Entre a majestosa miragem, se erguem barricadas.

De sons timbrados e ricochetar de balas perdidas

Penetrando em corpos inocentes e quase sem vida.

Cubro meus olhos e tampo meus ouvidos

Para não ouvir os estampidos.

E raios reluzentes passar sobre o céu ardente

Como um arco-íris de morte eminente.

Dois mundos tão diferentes

Como embriões gerados em um só ventre

No ventre de um mundo que foi feito para vida

E que estão sendo educados para a morte.

Meus filhos aprendem a contar

Pelas balas perdidas que perfuram As paredes desnudas

Do nosso quarto sempre na penumbra.

E lá ficamos aprisionados sempre encarcerados

Com medo de que o mundo nos rechace

Por nos acharem diferentes só porque nascemos

Em uma favela e somos discriminados.

Fecho a janela e me escondo como posso,

Para defender meus filhos de algum modo

De desumanos humanos, filhos sem donos,

De pais como eu que vivem no abandono.

Maria de Lourdes Boniceli