PONTO FINAL

hoje eu quero desesperadamente escrever

desanuviar o semblante que entorpeceu

gastar as mãos na folha lisa até que amasse

olhar o branco manchado de tinta cinza

debulhar o milho de minha infância

degustar o vinho envelhecido no carvalho

fugir do embuste que me armadilha

soltar o grito rasgando a garganta

arrastar a unha abrindo os poros

alargar a pele para riscar um cuidado

hoje eu quero apenas querer escrever

quero burlar aquele que em mim se esconde

saltar o abismo que me encobriu: madrugada!

e chegar até aqui, enfim, no ponto.