SEMEADURA I e II

SEMEADURA I

Não vislumbra destinatário voz sem rumo para surdos,

na semeadura necessária não avista logradouro nem campo semeado.

Adormecido tão bonito como um deus morto,

a gleba do rancor é o coração dos homens

: leira, canteiro, corpo inebriado, aorta entupida.

Até os ombros plantados no chão

na extensão verde monocromático

desdobram-se dálias vermelhas

entre ervas boas e as daninhas.

É certo que há correspondência entre a mão e a fome

entre semeador e talho no árido campo fértil

onde entorpece até certo ponto o coração do homem.

A voz que não vislumbra nem avista aqui resiste,

no prumo de seta é forja incandescente no tempo.

De outra era igualmente inconstante soa metálica

vem derretida no crisol, sêmen pólen de poemas.

***

SEMEADURA II

Esse deserto já foi uma floresta mas agora é sombra do incerto.

Sabe o semeador, por isso insiste no canto dos pássaros.

No descampado o canto das aves sinaliza a fome,

é a música das sementes sopradas no vento.

Se a palavra não mata no homem a fome,

as aves indicarão a perspectiva ao canto.

Por isso o canto é o campo,

território do corpo semântico.

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Baltazar

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 06/11/2017
Reeditado em 19/01/2018
Código do texto: T6164508
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