ESPÍRITO ATENTO

Estávamos na beira do abismo

O vento soprava

Tínhamos tempo

Um pouco

Mas nos bastava

Fitávamos a planície

A extensão das horas

O calar da tarde

Um sol que desaparecia

Mas havia algo

Sabíamos da espera

Não tardaríamos a saber

Então o vento parou

O cheiro do mato assaltava

O inseto avisava aos ouvidos

A noite prenunciava

Sentamos debaixo da lua

E o frio cortou

Luminárias no céu acenavam

Acendemos um sorriso

Aquecemos as mãos no atrito

Os pés descalços

A terra pulsava o assento

As costas em ângulo

Os olhos abertos

O espírito atento

A linha do horizonte apagada

Mas sabíamos do coração

Ele nos contou um segredo

Não tardamos a saber

Era sobre o vento

Arrebatava nosso peito

Incendiava os poros

Faiscava o semblante

Mexia nos arbustos

E soubemos do amor

Era ele quem nos havia chamado

Preencheu todo o platô

E já não era mais abismo

Era tudo o mais

E levantamos

Voltamos pela mesma trilha

Mas não guardamos passos

Não deixamos pegadas

Apenas descemos ou subimos

Não importa

Chegamos até aqui

Trouxemos o amor

Que fundou morada

O sol deu um salto

E um novo dia revelou

A noite que esperamos

Pensando no abismo

Mirando a planície

Sem saber ainda

Que o amor não viria de parte alguma

Pois era plenamente vida.