No fundo do baú
Tempos difíceis
de procurar antigos poemas
no fundo do baú...
e quando ressurgem, amarelados,
cheirando a guardados,
quase não têm mais sentido.
Tarefa tão árdua
essa de se desapegar dos sonhos
que, hoje, só parecem
delírios...
Tempos tão práticos
onde tudo parece ter solução
nas mãos de um especialista...
E não faltam autoridades
do saber
para registrar enganos
e transformar memórias,
aromas, paisagens, sabores
em desbotadas cores...
E, tudo isso, com apenas
meia dúzia de palavras
fatais...
Tempos despoetizados...
anoréxicos, amargos...
em que o fruto da árvore
mais familiar...aquela mesma
no fundo do quintal...
fez-se instrumento de condenação...
e, expulsos do paraíso
choramos de saudade,
despidos das lembranças
mas, cheios de razão.
Tempos de poemas escolhidos
por críticos exigentes...
de textos politicamente corretos
e pseudo-delírios formatados...
tudo impresso...nada escrito
com o abandono e despreocupação
das letras tortas...e desiguais.
Tempos de sentidos mortos...
que, sem o saber, repetem
tudo que já foi dito...
como se fosse novo...
Não há mais lugar para esses velhos escritos...
A não ser...no fundo mais fundo de um antigo baú...