boredom
meus fantasmas deram agora
de se fazer de existência
não esperam mais a mesa branca
o ritual com velas e objetos decorativos
surgem
tropeçam nas coisas
arranham
estragaram a pintura da minha geladeira
deixam marcas indeléveis
e as pegadas na cerâmica branca do banheiro
haja cloro pra remover
gostava mais quando não tinham cara definida
ou vinham com a aparência deformada
como a dos filmes de terror
era um negócio mais reconhecível
queria saber quem lhes empresta um rosto
ou será que escolhem por si sós?
tem uns outros
picardios que são
que resolvem ser na forma de bicho
gato, cachorro, mariposa...
sabem que tenho uma queda por bicho
que sou capaz de me arrebentar por causa de um gato
fazem troça da minha cara
é certo
devem rir aos montes
e eu
pobre cético
um pé no misticismo e outro na incredulidade
fico parvo
vejo as formas
ouço os estalos, farfalhos, os atritos
e nada faço
convenço minha mente do contrário
são fenômenos naturais
perfeitamente cabíveis nalgum sistema lógico
pertencentes ao mundo das coisas
destas que se pega com a mão
e se usa sem refletir o porquê
meus fantasmas
--uso o plural por que são muitos--
têm hábitos peculiares
gostam de bulinar nas minhas nádegas
uns outros batem asas no meu ouvido
tem os que sopram na minha nuca
sabem que gosto disso
estes merecem maior crédito e confiança
são da casa
formam minha família
herdarão minha herança