BEM-TE-VI

O dia começa.

O bem-te-vi indiscreto

grita sua indiscrição do alto da mangueira suburbana.

Berra desnorteado o homem do gás: nada vende.

A moça de salto e batom barato vem mais atrás.

Vem cansada do dia,

acena, marcando a orgia, no tempo de logo mais.

O bem-te-vi fotografa,

avisa que bem-a-viu,

espalha-espelha o boato,

equilibrando-se no fio.

Volta à mangueira o intruso,

no subúrbio é recluso,

do subúrbio é refém.

Aos gritos do bem-te-vi não escapa nada ou ninguém!

É o homem da marmita

que apanha da mulher,

é o vendedor de sonhos,

o vendedor de picolé.

É a criança com o gude,

o homem que amola a faca,

é a linha, é o cerol, é o carro da pamonha.

Numa janela qualquer, qualquer moça tristonha...

O dia termina.

O bem-te-vi mais discreto,

cansado de tanta indiscrição

cala a noite da suburbana mangueira

imersa na escuridão!