Amor II
I
Pensava ser meu espírito dulcíssimo quando sozinho, ser puro,
Como o bosque tênue no interior das primaveras
E cria ver no mundo o tênue bosque, e o interior das primaveras.
Mas o amor mostra a verdade sobre as gentes,
E soube-me quando apareceste.
II
Quando vieste, irmã, a tocar minha espádua larga,
A beijar-me a boca melíflua que escorria como um caminho,
Tornou-se meu espírito selva dura e maliciosa e vi no mundo a selva maliciosa e dura,
E minha boca crispou-se e contorceu-se, como se fechasse o caminho.
A amizade do cordeiro me escapou ao espírito escuro e fechado,
Porque no cordeiro pressenti o sátiro que logra e engana e toma.
O cavalo, antes de ti gracioso,
Que jorrava as patas belas sobre a grama verde e nua,
Depois de ti pisou e despedaçou a grama verde e nua,
E nele vi um perigo.
III
Torno-me selva rude toda vez que te amo,
Porque meu orgulho é muito.
Se tivesse eu a natureza calma e dócil dos servos e planetas,
Pouco me importaria com o perder-te para as distâncias,
Porque compreenderia assim o ser das coisas, o perder-se nas distâncias,
E desse modo compreender é extinguir a perda.
Mas tenho a natureza dos reis e das esferas brilhantes,
Cujo destino são os venenos sombrios e as solidões monstruosas.
Tenho a natureza dos traídos,
Que é o sentir nada mais haver no cosmo além de reis e esferas brilhantes, que é o achar-se necessário e indispensável.
Torno-me selva escura cada vez que te amo,
Porque é muita minha empáfia, meu egoísmo, minha mesquinhez, meu orgulho.
Porque meu existir é um pecado seco e bruto, como um soco.
IV
E se assim é, meu existir um pecado seco e bruto,
É para que vivas do meu sangue e da minha carne,
E para que nisso haja justiça.