Dignidade
Meu Deus,
Que nos seja permitido morrer com dignidade,
Se não nos é possível viver com dignidade.
Se não nos é possível uma vida num campo,
Nas margens dos mananciais manchados de rosa pelo crepúsculo
Sem que precisemos, cansados,
Fustigar a terra com enxadas rotas
Através da vida,
Extraindo açucares que outro leva à boca,
Que haja paz em nosso encontro com o mistério,
Ao menos.
Meu olho pesa.
Minha vista oscila,
Porque vejo o que não quero e não me é permitido escolher,
Porque sem querer vejo morrer de fome
Aquele que planta,
E gordo aquele que espera.
Como acostumar-me a isso?
Que razões para acreditar que isso é o certo e assim deve ser?
Por que a culpa me ataca toda vez que é frio e eu solto meu corpo sobre a cama
Cálida, como se o deitar-se sobre a cama cálida
Fosse crime hediondo?
O que será que eu não quero saber, mas sei?
Minha fortuna é um vício
Ou é o mínimo?
Devo proteger-me do sol,
Quando o sol foi-me dado de graça,
Ou devo aceita-lo por isso?
O que quereis de mim?
Às vezes, quando penso forte nos heróis,
Resta o homem
E é como se perdesse o Cristo e a cruz em um rio escuro
E ficasse o menino,
Sozinho entre o estado que lacera e a nação que acolhe.
Ensinai-me a amar
Ou extrai de mim a compaixão,
Meu Deus,
E que nos seja possível ao menos morrer com dignidade,
Se não nos é dado viver dignamente.