TEMPORAL
Com a boca escancarada
num riso disforme
a cidade grande
me absorveu
Os veículos insistiam em passar por mim
Os edifícios ameaçavam cair sobre mim
Os homens
animais ruminantes
deglutiam idéias
sob o peso implacável dos dias
num estertor antagônico
vida-morte
Camuflavam o verso
Na incerteza segura da vida
a certeza segura da morte
assaz querida
"só morrer é seguro"
Contudo meu tempo agitado
acalmou-se como um temporal
irmão-gêmeo do após dilúvio
e entre os veículos que vomitam poluentes
um homem-eu olhava o asfalto
Na linearidade da rua
de um sonho esqueci-me de lembrar
O temporal conservou intacta
a mulher.