PASSAGEIRO
Esse trem já rodou meio mundo
E nesse tempo
Meus olhos graúdos foram se enchendo do negro da noite
E conforme a vida ardia
Pingava o orvalho das madrugadas
Cerrando ao se deparar com abismos
Bendita viagem
Ao longe eu ouvia
O ranger das rodas nos trilhos
O corpo tremia e a voz embargava
Tudo bem, eu dizia
Lamento tornado em canto
Mas eu não acreditava
Quando eu descer
Lá na frente
De peles murchas
vista gasta
Memória roída
Não será ponto final dessa estrada
Chegada ou partida
Eu desconfio
Que ao longo do percurso
Em algum ponto obscuro
Meu coração desembarcou
Antes de mim
E seguiu sozinho para outra cidade
Se o condutor
Redefiniu a rota
E moveu as entrelinhas da paisagem
Meu corpo pode morrer de cansaço
De peito vazio e em pedaços
Que eu estarei sempre de passagem