A INVENÇÃO DO PASSADO

Inventamos um passado

para nos abrigar do tempo,

para lidar com as perdas,

mudanças e mortes

que definem a vida.

Inventamos a doce prisão

de nossa nostalgia,

de nossa ilusão de uma origem tranquila,

de uma juventude idílica,

ou de uma duvidosa inocência irremediávelmente perdida.

Inventamos identidades,

padrões e origens paradisíacas,

porque não suportamos o efêmero

e todo a insignificância que desde sempre nos define.

Contra o próprio tempo

inventamos passados

e nos tornamos trágicos,

demasiadamente humanos

e assustados.

Fugimos do esquecimento

produzindo memórias,

histórias e mitos,

contra tudo que nos preenche

como um grande e inumano vazio.

Inventamos em nós árvores e pedras

para permanecer sobre a terra

enraizados e duros,

quase felizes.