desejo não nomeado

Cobrimos o pântano, não para ocultar,

mas para revelar os esquecimentos ancestrais,

O desespero, mais que palavra, é gesto -

água que em pedra delgada se desfaz.

É a onda, que ao quebrar-se nas rochas,

sonha, sem desvelar, o indizível,

Salvo pelo círculo que nos convida

à agonia, sangue que em brasa se inscreve no céu.

Impurezas vermelhas, acesas, escorridas,

nos guiam ao bueiro da verdade,

onde olhos crepusculares se abrem

para amanheceres de névoa e bosques profundos.

No mesmo caminho, te encontro,

nome derramado em folhas,

alquimia lenta de vidas e vales míticos,

olhos de pêssego sob copas que sussurram.

Tua pele, promessa de cetim,

promete prazeres intensos,

e eu, à porta do destino inexistente,

imagino paraísos perdidos, pensamentos secretos.

Um vórtice faminto, sem nome,

nomeia enquanto deseja e devora

nossa fertilidade, feita e desfeita,

engolida, ainda tivemos tempo para o amor.

Esse amor, doloroso escrutínio,

nos afoga fora do tempo,

e nos teus cabelos me alucino,

descendo ruas incineradas pela espera.

Meu desejo, ferida feroz

enquanto o mundo, indiferente, segue,

tu, vista e tocada, crias comigo este poema,

antes que o cinismo nos empurre ao abismo.

este abraço de degelo, desertor,

revestimos o pântano, não para esconder,

mas para lembrar o que foi perdido,

e no perdido, encontrar o que nunca se foi.