Sua Voz Quando Você Calou

Eu sou as horas que o relógio não marcou

Eu sou o isolado em meio à multidão

Eu sou a música que você não ouviu

Dos velhos erros eu sou a repetição.

Sou a tempestade arrebentando a vidraça,

Eu sou a chuva que te molha por inteiro

Areia que o vento carrega no deserto

A nau que fugiu pro mar sem paradeiro.

Eu sou os teus olhos refletidos no espelho.

Eu sou o meu próprio reflexo invertido

Eu sou o nó que nunca deixa a garganta.

Eu sou aquele velho grito inda contido.

Eu sou as mãos do idoso, agora trêmulas

Eu sou as pernas inábeis daquela criança.

Eu sou dúvida dos caminhos da vida.

No baile eu sou o medo de entrar na dança.

Eu sou a tua lágrima que nunca caiu,

Ou o teu choro que ninguém percebeu.

Nas horas de claridade eu era o cego.

E no momento de errar eu era eu.

Aquela ave voando mais alto eu era

Não pela beleza de seu vôo sagrado

Mas para não estar tão perto dos olhos

Que veriam o meu corpo machucado.

Eu sou a cicatriz que restou da batalha,

Eu sou aquele que nunca voltou em glória,

Sou os escudos partidos sobre o campo,

O guerreiro que morto, não deixa história.

Eu sou o esquecimento mais silencioso

Dos momentos eu sou o mais solitário

Na lembrança eu não tenho peso ou forma

Do tempo presente eu sou um relicário.

Sou a pergunta que não teve resposta

Sou resposta que não esclareceu a mente

Sou o trecho de uma melodia inacabada

A mágoa antiga que ainda se ressente.

Sou a atitude que não fez diferença

Verdade que não irá para salvar ninguém.

Um número longo em um cartão de ponto

Qualquer um dos vagões no meio do trem.

Eu sou brisa, que você não vê ou toca

Mas que passando por teus lábios te beijou

Eu sou as teclas que se quebraram no piano.

Eu sou a sua voz quando você calou.

Edson Gomes
Enviado por Edson Gomes em 09/12/2005
Código do texto: T82767